quinta-feira, maio 26, 2005

O jantar

Passara todo o dia preocupado com preparativos daquele que seria o mais importante jantar de sua vida. Pela manhã tentou localizar sua ex-esposa, pedir-lhe uma opinião. Era ela quem entendia daquelas coisas. Teve saudade do tempo em que eles ofereciam jantares maravilhosos aos amigos. Às vezes para comemorar algo, outras vezes - a maioria delas - apenas para reunir os entes mais queridos. “Éramos felizes”, pensou.
Não conseguiu lembrar o motivo da separação. Foram marido e mulher durante dez anos. A relação deles era a melhor possível. Um dia acordaram e perceberam que não havia mais nada que os mantivesse juntos e decidiram se divorciar. Motivo único e bastante. Ele ligou, mas não a encontrou em casa. Estava viajando a trabalho. Pensou em falar com sua mãe, mas não iria incomodá-la com aquilo. Já bastava o que viria depois...
Surgiram em sua mente cenas de sua infância. Os amigos que não tinha mais, as histórias e cantigas de sua mãe, as manias de seu pai... Era como se estivesse vivendo tudo aquilo de novo. Sentia uma enorme alegria dentro de si. Começou a chorar.
Durante muito tempo aquelas lágrimas ficaram presas em seu coração. Não chorou de tristeza quando perdera o pai, nem quando perdera o filho. Muito menos de alegria quando se casou, ou quando ganhou o prêmio mais importante de sua carreira. Agora elas rolavam pela sua face, lágrimas de toda uma vida.
Deitou-se, dormiu.
Acordou. Lembrou-se do jantar. Já não teria tempo de preparar mais nada, nove da noite. Pensou em quão ridícula era aquela idéia. Para que aquele jantar? Era uma despedida apenas, não havia porque comer ou o que comemorar.
Bateram à porta.
- Pode entrar, está aberta.
Ela entrou. Estava com um vestido branco, esvoaçante, lindo. Havia muita luz. Com alguma dificuldade conseguiu enxergar algo além do vestido. Os longos cabelos loiros, os olhos tão azuis, mas tão azuis... As mãos lisas e brancas lembravam-lhe uma boneca de porcelana, como as que sua ex-esposa colecionava.
- É mesmo você? Assim? - perguntou, sem obter resposta.
Seu corpo foi tomado por uma sensação de extrema leveza e liberdade quando ela segurou-lhe as mãos.
Depois, só se ouviu o silêncio.


Rafael Rodrigues

1 Comentários:

Às 11:13 PM , Anonymous Anônimo disse...

Rafa vc tá bem?hehehehehehehhehe...Seus textos estão se superando!A cada dia q passa percebo q vc é esquisito!Brincadeira!Estão ótimos!Um cheiro!

 

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