quinta-feira, dezembro 01, 2005

Semente de Cânhamo

Verde e efusivo, o aroma das relvas adentra as narinas. O tempo se contrai e a noção do tempo se dilata. Instante a instante, em um lento e entorpecente processo, o odor se torna um com os pulmões. O mundo muda em minutos que mais parecem segundos.

A música não é mais nem menos música, é outra música. A luz não brilha mais nem menos, mas brilha de outra forma. Os cheiros não ficam mais fortes, mas causam outras sensações. O vinho não azeda ou adoça, mas seu sabor é único. Mas a palavra - ah, a palavra - esta sim se torna mais poderosa.

A palavra, que nos passa desapercebida a cada segundo, a cada dia, ganha vida. Não a palavra em si, porque a palavra não é senão imagens sonoras em nossa mente. O que se amplia é o significado que atribuímos à mesma. Bola é uma palavra bastante simples: uma bilabial surda e uma líquida aberta. Mas o universo que se abre na mente quando a imagem sonora da bola se forma na mente é infinito. É possível observar palavras como paralelepípedo e desconstruí-las com a naturalidade de quem a criou. Paralelos. Paralelas. Parabólicas. Paranomásias. Paralelo e paranomásia são paranomásias. Então há uma metaparanomásia.

Seria a palavra uma metáfora da própria palavra? As idéias se misturam e um dilúvio de pensamentos e divagações toma a lógica dos paralelepípedos. Em alguns segundos tudo terá desaparecido. Tão rápido como um fósforo sendo aceso ao meu lado. Tão logo a chama prenda minha atenção e me atire em uma superfilosofia a respeito da chama.

O odor vai se tornando suave e, ao tornar-se suave, volta a ser perceptível. O aroma verde da relva abandona os pulmões e o tempo retoma seu fluxo natural. O olhar se desvia para as ruas enquanto um cigarro é aceso. O sabor é o mesmo de sempre. As luzes são as mesmas de sempre. O mundo volta ao normal. A boca, expelindo fumaça e nicotina, está sedenta. Sedenta de água. Sedenta por palavras. Mas todas as palavras parecem iguais. Tudo é cinzento como a realidade.

A realidade é imprescindível. Sem ela, não há valor algum no êxtase. Sono. Vou dormir.

Victor Caparica tem 24 anos, é cronista, aluno da Faculdade de Ciências e Letras da UNESP, e acredita que projeção mental se trata de mais do que ser louco.

2 Comentários:

Às 7:55 PM , Anonymous Anônimo disse...

... estou em débito com alguém daqui ;-)

 
Às 9:33 PM , Anonymous Anônimo disse...

Os críticos de música são quase unênimes em dizer que "4", o último álbum do Los Hermanos é uma apanhado de canções com letras subjetivamente belas... Eles precisam ler este blog aqui, meu caro. Comprei o disco do Los Hermanos e ainda estou digerindo, pois é mesmo muito diferente dos outros três e aí está a diferença. Aqui, o trabalho de digestão é pequníssimo, pois suas palavras são como um passeio ao belo leterário. Ihhh! Olha só o que escrevi, he he he he. Subjetivo ao extremo!


Por Todos Os Lados, traz algumas de minhas memórias: http://portodososlados.blogspot.com

Vertentes de Mim, traz as últimas de meu filhão: http://ijdlf.zip.net.

 

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