terça-feira, janeiro 17, 2006

Reflexos

* Postado originalmente em 15/08/2005

Deitado na cama, quarto às escuras. Som ligado, volume alto. Incomoda os que estão do lado de fora. A qualquer momento alguém pode abrir a porta e vê-lo cantar, acompanhando o disco. Está totalmente entregue àquele momento. Daquela forma ele celebra sua solidão. Não se importa com os estranhos que podem invadir seus domínios a qualquer momento. Nem mesmo lembra de si próprio. Apenas ouve e canta. Se a música incomoda aos outros, não é problema seu. Poderia passar dias, meses, anos, fazendo aquilo. Repetindo canções, exaltando-se com elas. Sentido-as invadir seu corpo, correr por suas veias. Lembrar da pessoa amada e sentir um frio na espinha.

Ali está ele: inofensivo e vulnerável. Aparentemente. Basta que alguém abra aquela porta e ele é capaz de destilar mais veneno que a mais mortal das cobras. Não se sente na obrigação de ter alguma paciência com quem quer que seja.

Estava com os olhos abertos, olhando para o teto que não conseguia enxergar. Agora fecha os olhos e dá de cara com o travesseiro. Pede – ao vazio – mais alguns minutos. Relaxa. Não quer mesmo sair dali. Não sabe se está sendo ou se foi observado. Para ele, nada mais importa naquele momento. Apenas ele e somente ele.

São poucas as vezes que consegue esquecer de tudo e de todos. Principalmente de si mesmo.

Não tem mais tempo. Levanta-se. Fim da escuridão. A luz toma conta do quarto, antes iluminado pelas trevas.

Pensa em todos que ele irá enfrentar. E pensa – sabe – que é fácil enfrenta-los. Difícil é encarar a si mesmo, diante do espelho.



Rafael Rodrigues
(há muito, mas muito mesmo, tempo atrás...)

1 Comentários:

Às 12:31 AM , Anonymous Anônimo disse...

Muito, muito bom... Principalmente a última frase... Parabéns!!!

 

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