sexta-feira, julho 01, 2005

Chover no molhado



Estava a refletir muito neste dia de hoje sobre uns pensamentos que andavam incomodando, de certa forma, minha perturbada mente. Você deve ter visto muitos filmes hollywoodianos (pelo amor de todos os deuses, estou falando disso de novo!), séries americanas e etc. Vejo que a audiência é quase completamente garantida pelos enredos intrigantes de como os jovens e adolescentes problemáticos, inseguros de si e revoltados se saem no dia-a-dia, com seus dramas e romances infelizes. Nem é preciso ir muito longe, Malhação atende todos os requisitos pedidos dos dramalhões adolescentes. Essa é a realidade? O quanto nos influencia?

Se a gente pára e presta um pouco de atenção em nossa volta, na maioria dos ambientes de saída que geralmente freqüentamos, salvo os casados(pressupostamente) e os mais velhos, podemos perceber caras melancólicas, roupas irreverentes(nada contra estilos, o meu não é um dos mais ortodoxos) e atitudes muitas vezes intrigantes, para não dizer grotescas. Somos o depósito das porcarias que vêm de fora, mas cadê a novidade nisso?

Não existe novidade nisso, ouvimos estórias, vemos situações, mas muitas vezes somos vítimas de tal banalização e supervalorização de subterfúgios utilizados para que se escondam do mundo dito real.

É bastante compreensível se identificar com a mocinha que tem dúvidas quanto se deve perder sua virgindade com o namorado, com o mocinho que não consegue perder a sua de maneira alguma, com o filho que tem problemas em casa com os pais e por isso foge nas drogas, nas amizades, na vida desregrada e toda sorte de carpe diem deturpado. O problema começa quando por não haver identificação passa-se a invejar os problemas, os conflitos e a ação inconsciente de incorporar o personagem toma forma na vida do telespectador. A vida não faz tanto sentido, por que seus pais lhes dão tudo que pedem? Por que o namoro é tão perfeito e preciso sofrer por amor para ter uma linda história de contos de fada? O ordinário passou a ser sinônimo de démodé, piegas, apagado demais para aqueles que sonham em viver intensamente.

Quando visualizei o texto, pretendi fazer algo mais como um manifesto, pois me recuso a acreditar que somos tão influenciáveis e imaturos ao ponto de desejar o sofrimento em detrimento do saudável, que possamos fazer opção de simplesmente deixar a vida comum e prazerosa, como só ela, pela dúvida, pela falsa esperança de que “no fim dá certo. se não deu, é porque ainda não chegou ao fim". Como não vemos que recebemos overdoses e overdoses de auto-ajuda, de auto-convencimento de terceiros de que faz parte da vida ao invés da dura verdade de que o comodismo, orgulho, pré potência, egocentrismo, sociocentrismo e negligência fazem pessoas simplesmente fracassar, amargurar a derrota, o sabor da impotência por terem finalmente se tornado escravos de seus gênios indomáveis, de suas teimosias inabaláveis, de seus orgulhos dogmáticos. Alfie talvez seja um bom filme para se ver um retrato um tanto fiel do destino de certos estereótipos tão comuns hoje em dia.

Há quem diga que é chover no molhado, concordo. Que não trago nada de novo, bravo! Mas talvez insista na frase do, dito pseudo-poeta, Renato Russo sobre certos assuntos que o assombravam constantemente: “sei que às vezes uso palavras repetidas, as quais são as palavras que nunca são ditas...”.

Eduardo Leite

3 Comentários:

Às 2:15 AM , Anonymous Anônimo disse...

Todo mundo sabe que eu quero ser escritor. Ou algo do tipo. E antigamente eu pensava que pra ser escritor você tem que ser triste, tem que acontecer um monte de tragédia, tem que beber e fumar um bocado e tal. Mas não é assim. A escrita não depende disso. Eu lembrei desse meu pensamento quando vi essa parte do texto: "O problema começa quando por não haver identificação passa-se a invejar os problemas, os conflitos e a ação inconsciente de incorporar o personagem toma forma na vida do telespectador."
E na realidade, nada disso é verdade. O que nos faz pensar da maneira que eu pensava e querer se tornar um personagem de novela - no caso do texto - é talvez o vazio que existe dentro da gente. E que pode ser preenchido com coisas tão banais e tão mais legais, que por serem banais às vezes ignoramos, mesmo quando está à nossa frente. Filosofei, ein? Abraço, Rafael Voz.

 
Às 9:49 PM , Blogger Rafael Reinehr disse...

Nada a acresentar.

Repetir palavras é uma necessidade no mundo de hoje. Um mundo onde a velocidade aumenta cada vez mais e nossa percepção do que acontece ao redor diminui a passos largos.

Dominar o ritmo do mundo moderno é um desafio que não só as palavras, mas também elas, repetidas exaustivamente, até os ouvidos doerem, devem ajudar a vencer.

 
Às 1:56 AM , Anonymous Anônimo disse...

Eu já havia refletido bastante sobre o assunto, mas seu texto me fez lembrar o trecho de uma música do Renato Russo:

"e há tempos são os jovens que adoecem,
há tempos o encanto está perdido e há ferrugem nos sorrisos
e só o acaso estende os braços
a quem procura abrigo e proteção"
Há tempos - Renato Russo

E de alguma forma, esse trecho e seu texto falam da mesma coisa, é o que vc já disse, não há nada de novo aí, apenas escrito de outra forma.
Anyway, adorei o texto.

Bjoos,
KEL

 

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