segunda-feira, junho 27, 2005

Noite de Natal

José abriu a geladeira, tirou uma cerveja e foi para a sala se sentar. Aconchegou-se em seu sofá marrom surrado e abriu a lata enquanto procurava pelo controle remoto. Ligou a TV e passou os canais, nada interessante, ficou com o jogo do Vasco.

Seus olhos estavam na televisão, mas seus pensamentos voavam e logo se assustava com um grito do narrador dizendo que quase saíra um gol do time adversário, isso despertava seus grandes olhos castanhos escuros e o franzia a testa em tentativa de se concentrar novamente.

Não sabia se o incomodava mais o barulho dos carros que cortavam a avenida em frente ao seu pequeno apartamento ou o silencia ensurdecedor desse feriado que o fazia se perder em seus próprios pensamentos. Era Natal e ele estava só, tinha parentes, mas não os queria visitar, o que dizer do rumo que tomou sua vida? Como contar que tinha vergonha de passar o quinto feriado sem apresentar nenhuma namorada ou mesmo namorado que fosse, sem uma satisfação. Era só, por opção talvez, medo, fraqueza.

Estava cansado daqueles pensamentos, não era seu hobbie mais interessante ficar amargurando erros, arrependimentos. Embora não agüentasse mais se ver sozinho, perdido, não suportava pensar em seus erros cometidos, nos amigos perdidos, nos amores que nem chegaram a ser amores, na sua vidinha vazia, inútil, sem sentido.

Foi na farmácia do apartamento, procurou os frontais que o psiquiatra passara para ajudar em seu sono, os havia comprado no dia anterior, queria ter o suficiente para as festas que seriam os dias que mais precisaria de um sono firme.

Deitou-se em sua cama e novamente vasculhou sua secretária eletrônica para ver se haviam mensagens, nada... pensou em escrever uma carta, mas para quem mandaria? Para os amigos que magoou? Não, era orgulhoso demais para isso. Para os pais que o encorajaram a estragar sua vida? Não, era passivo demais para isso também. Foi no computador checar seus e-mails, apenas mais e-mails de estranhos que o queriam adicionar no orkut, nenhum e-mail que gostaria de receber, quem não retribuía dificilmente achava uma fonte que jamais secasse sem ser reposta, não desligou seu PC, apenas voltou à cama para tentar dormir.

O silêncio voltava para o atormentar e o José não suportava mais o maldito silêncio, queria que ele se calasse. Ligou o som de uma banda qualquer, daquelas que falam de carros e mulheres gostosas em festas cheias de amigos e com muita bebida, tomou dois frontais, abriu sua caixa de sapatos e colocou o conteúdo na seringa esperando o sono chegar. Ao sentir-se mais sonolento tomou mais dos calmantes, a caixa inteira pra ser exato e tomou a picada do mosquito vermelho.

O silêncio não incomoda mais o José nos dias de Natal, ele tem novas companhias, pessoas de várias idades e sexos, todos são silenciosos, mas nunca solitários. Lá ele jamais ficará só de novo.



Eduardo Leite

3 Comentários:

Às 9:54 AM , Anonymous Anônimo disse...

Vou colaborar com algum testinho, assim que conseguir administrar minimamente meu tempo, falou? Por aenquanto sigo acompanhando as histórias interessantes de vocês. Há braços!!
Mauro Castro (Taxitramas)

 
Às 10:22 AM , Anonymous Anônimo disse...

Eu li primeiro que todo mundo... lalalala hehehe
Abraço,
Rafael

 
Às 4:50 PM , Anonymous Anônimo disse...

Aham... como sempre mandou mto bem...
O final ficou super original ;D
Continuo esperando a cifra dakela canção "Cores Primárias"... =\
Bjão =**
KEL

 

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