quinta-feira, dezembro 15, 2005

Tríade

Tossiu. Culpa da garganta levemente arranhada que odiava tanto. Seu humor não era dos melhores, quem o conhecia sabia o quanto isso o incomodava.
Vestia suas roupas de sempre, nada de extravagante ou ridículo. Chegou depois de meia hora de caminhada. Se aproximou da porta e bateu três vezes compassadas com os nós dos dedos. Esperou.
Do lado de dentro, Rafael não precisava saber quem era, a volta já era esperada. Foi em direção à porta. No caminho falou para Eduardo, "reunidos novamente, acredito".
Ao abrir a porta, sorriu. Os amigos se abraçaram calorosamente. "Seja bem vindo de volta, meu caro". Eduardo chegou logo depois, estava com um livro nas mãos que logo foi deixado de lado, ao perceber quem havia chegado. Repetiu o mesmo ritual feito por Rafael. O amigo olhou para os dois, sem pronunciar nenhuma palavra. Ergueu um de seus braços, com dedo em riste, e soltou suas primeiras palavras em um ritmo cômico: "Eu voltei, agora pra ficar, porque aqui, aqui é o meu lugar". E os três amigos riram. E logo sentaram-se para mais uma conversa.

"É bom estar de volta. Acredito que esse tempo longe das capitais fez bem para mim". Passara um mês fora, e agora as vozes estavam reunidas novamente. Havia uma nova sensação no ar, como se já houvesse sinais dos novos tempos.
"Conseguiu o que queria com isso?", perguntou Rafael servindo lhe uma xícara de café. "Para dizer a verdade, meus caros, teria de responder com uma meia resposta: sim e não. Me desliguei um pouco das minhas palavras para dar um mergulho na minha própria vida. Assim tudo ganha mais intensidade. Conheci novas pessoas. Algumas em especial, que me deram novos ares, até para algumas poucas palavras que escrevi nesse entreato. Mas, ao mesmo tempo, bebi de fontes muito amargas que me deixaram desconfortável".
Nada era melhor do que a volta para casa, depois de tempos longe dela. Parecia tolo, mas cada vício daquele lugar era um conforto pessoal. As folhas do calendário passaram muito rápido nessa jornada. E o tempo não pararia um segundo para qualquer um deles pensar em tudo que lhes havia ocorrido naquele ano.
"Acostume-se com isso. Por mais tentemos de certa forma fugir das dores, sempre encontramos espinhos que perfuram nossa mão. Mas espero que todas minhas palavras tenham lhe servido de ajuda para a sua busca".
"Sim, Dudu. Tanto suas palavras como as do Rafael me serviram em diversas horas. Por isso que volto com uma imensa vontade de continuar de onde paramos e prosseguirmos imediatamente. Talvez eu ache que já perdemos tempo demais aqui".
Rafael bateu as mãos, aquecendo-as. Abriu um velho caderno, retirou uma caneta do bolso e disse: "mãos a obra então, senhores?"
Eles estavam juntos novamente. As três vozes reunidas naquela sala, construindo sonhos que começariam naquele velho pedaço de papel. Às vezes, paravam para uma xícara de café ou para rir de piadas estúpidas que nascem com a convivência. Mas logo voltavam aos seus planos.

Um ano já havia se passado desde que se conheceram. Ano que agora agonizava seu fim. Um ano de desventuras e amores. Milhares de histórias contadas por aquelas mãos. Histórias que cruzavam ou não a fina linha entre o real e o imaginário. Palavras expostas para quem quisesse ler. Ora contando uma simples história, ora querendo ferir o leitor como quem os machucou.

Quando o relógio virou meia noite, eles brindaram. Um ano, diziam. Aquele tinha sido o melhor ano de suas vidas. Naqueles sorrisos, o que estava escondido, era uma estranha sensação guardada no fundo do coração. Onde eles já se atreviam a imaginar o futuro. Tinham uma leve sensação de que tudo que estava por vir seria melhor ainda.

Eduardo, Rafael e Thiago tomaram um dos maiores porres de suas vidas naquela noite. Mas pouco se importavam com a ressaca do dia seguinte. Sabiam que muito em breve, as anotações daquele papel seriam, por fim, construídas. A Tríade estava de novo formada e voltaria quando tudo estivesse em seu lugar.

Thiago Augusto
(11-12-05)

1 Comentários:

Às 11:13 PM , Blogger 3 Vozes disse...

Eu quase chorei quando li. E sim, esse foi o melhor ano de minha vida. Abraço, Rafael

 

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial